Infelizmente, mais uma vez, a eleição no Brasil é tratada como um simples objeto de vingança pessoal, e que, mais […]

Voto útil e voto de protesto: duas coisas que o Brasil não precisa

Infelizmente, mais uma vez, a eleição no Brasil é tratada como um simples objeto de vingança pessoal, e que, mais importante do que pensar na eleição como o meio mais adequado para construção de um projeto de país que consiga ser melhor para a maioria da população, pensa-se apenas na possibilidade de anular o outro, mesmo que se tenha que recorrer a mentiras e falsidades que se alega estar combatendo.

Esse cenário de anular o outro explica a polarização da eleição entre dois lados antagônicos, irreconciliáveis e que relegam a administração do país ao segundo ou terceiro plano, apresentando propostas de pouco conteúdo ou soluções mágicas e inatingíveis, além de desconsiderar absolutamente a possibilidade de uma reforma política que devolva o poder ao povo.

O chamado voto útil é uma imbecilidade, pois faz o cidadão agir igualmente aos políticos que ele tanto critica e condena, ao renunciar às suas próprias crenças e convicções, no intuito de promover alguém que lhe parece menos conturbado e “perigoso” que o outro.

O voto de protesto é pior ainda, porque sempre mira a votação em alguém que, de certa forma, representa o escárnio, a antítese, a aberração encarnada e a negação de tudo que o stabeleshiment político representa e, sem querer, acaba reforçando o domínio político e econômico da pequena elite que se conserva sossegadamente no poder há décadas e décadas.

O voto de protesto foi inaugurado no Brasil ainda na década de 1950, quando os paulistanos elegeram o rinoceronte Cacareco vereador, que na verdade pertencia ao zoológico do Rio de Janeiro e, sendo emprestado para inauguração do zoológico de São Paulo, obteve a simpatia da população que acabou votando nele como seu representante na câmara municipal.

Após a ditadura militar e em meio a grave crise econômica dos anos de 1980, os cariocas, em protesto absoluto, lançaram a candidatura de um chimpanzé chamado Tião, que vivia no zoológico daquela cidade, em 1988. Segundo se apurou à época, o Macaco Tião teve nada menos que 400 mil votos, sendo o terceiro mais votado do pleito.

Mais recentemente, o macaco, ou melhor, o palhaço da vez é o Tiririca, que deve se encaminhar para sua terceira legislatura sem qualquer contribuição para melhoria da gestão política nacional.

O que explica o voto de protesto além da insatisfação com a política é a sua relação com o nada precisa ser feito, ou como idealizou o próprio Tiririca; pior do que tá não fica.

Ao decidir pelo voto de protesto o cidadão assume a sua inércia social e aceita pacificamente a sua incapacidade de querer agir proativamente em prol da melhoria das condições da relação entre governo e cidadão.

O eleitor do voto de protesto não questiona se o seu candidato apresenta propostas consistentes, não se importa que ele não entenda os outros ou se não entenda de política ou de gestão. Esse candidato, para o eleitor, não precisa sequer ser humano. Basta apenas que ele não faça nada; não pense, não chore, não aja, não planeje e não se importe com os outros, porque assim sendo, no mínimo, ele será igual aos outros que já estão lá.

Infelizmente, essa ideia errônea de protesto, que troca competência por resistência ao outro, poderá fazer chegar à presidência da república alguém totalmente despreparado para o nível de inteligência, de capacidade, de visão e de responsabilidade que o cargo exige, jogando o país, mais uma vez, na rota do retrocesso e da inércia econômica e política, quando ao invés de falarmos e vivermos um ambiente de inovação tecnológica, de competitividade empresarial, de crescimento de registro de patentes, da reinvenção do turismo, da paixão esportiva nacional e do retorno da harmonia e da parcimônia entre as pessoas, estaremos mais uma vez falando de dor, de perda, de crise e do retorno de generais, macacos, rinocerontes e de palhaços ao centro do debate político.

*José Walmir Monteiro da Silva é escritor, professor e economista.

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