O Amazonas se destaca na mídia nacional quando o assunto é o desvio de recursos na saúde pública do Estado. […]

Denúncia: Governo do AM se destaca na mídia nacional por desvio de recursos na saúde

O Amazonas se destaca na mídia nacional quando o assunto é o desvio de recursos na saúde pública do Estado. Enquanto a população fica à mercê do descaso e pacientes aguardam por vagas nos hospitais do SUS, em filas de espera que parecem não ter fim, o governo do Amazonas paga – com dinheiro público – todas as despesas particulares de autoridades e amigos em um dos hospitais mais caros de São Paulo, segundo mostrou a reportagem do programa Fantástico, da Rede Globo, na noite do último domingo (8).

Entre 2012 e 2016, cerca de 4,5 milhões de reais foram gastos pra servir de plano de saúde “cinco estrelas” a alguns privilegiados. Essa quantia foi diretamente destinada ao Hospital Sírio Libanês, localizado em São Paulo, que é reconhecido como um dos melhores do país. Durante esse período, o estado estava sendo governado pelo atual senador Omar Aziz e José Melo – que se encontra preso por suspeita de desvio de recursos da saúde.

Em fevereiro de 2013, o governo do AM destinou R$ 250 mil ao Hospital Codajás, situado na avenida Codajás, bairro Praça 14 de Janeiro, zona centro-sul da capital amazonense. No mesmo mês e ano, a gestão do poder executivo pagou a conta do tratamento médico do ex-prefeito de Santa Isabel do Rio Negro (interior do Amazonas), Mariolino Siqueira, no Hospital Sírio Libanês (SP), no valor de mais de R$ 280 mil – isto é, desembolsou 30 mil reais a mais com as despesas médicas de uma pessoa do que deu para um hospital inteiro. Mas a lista de beneficiados com o dinheiro público não pára por aí…

De acordo com os ministérios públicos, estadual e federal, o ex-prefeito – preso em 2016 por suspeita de corrupção – e mais 20 pessoas tiveram as contas de seus tratamentos particulares pagas pelo governo. Segundo a promotora de Justiça do AM, Cláudia Maria Raposo da Câmara, não havia um critério de autorização definido pelo Estado que permitisse tais pagamentos. “Eram pessoas que teriam uma certa influência, política ou social, na administração pública”, explicou.

“Esses tratamentos não foram custeados a partir de uma política pública de saúde no âmbito do SUS. O estado do Amazonas fez, às vezes, de um plano de saúde particular que foi utilizado em benefício exclusivo desse seleto grupo de pessoas”, salientou o procurador da República do AM, Thiago Corrêa.

Sede do Governo do Estado do AM
Sede do Governo do Estado do AM, localizado na zona oeste da capital – Foto: Divulgação

Gastos hospitalares dos privilegiados

Conforme mostrou a reportagem do programa, em um ofício encaminhado ao Hospital Sírio Libanês, a secretaria da saúde amazonense informou que iria arcar com os gastos hospitalares do desembargador Domingos Jorge Chalub Pereira. No total, a conta ultrapassou o valor de R$ 230 mil. O Ministério Público afirmou, ainda, que o governo também se responsabilizou pelas despesas de parentes de outros desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado (TJAM).

Entre os gastos, a secretaria de saúde pagou as despesas médicas de Maria da Graça da Costa Vieira (no valor de R$ 130 mil), mãe de Lafayette Carneiro Vieira Júnior, atual corregedor geral do Estado. Dois meses depois, em setembro do mesmo ano, o governo também bancou os custos de Giovanna Maddy Figlioulo Vieira – esposa de Lafayette -, totalizando R$ 24 mil.

Entre fevereiro de 2013 e março de 2014, o governo desembolsou mais R$ 345 mil pelo tratamento de Fabiano da Silva Pessoa Figueiredo, sobrinho da desembargadora Graça Figueiredo. De julho a dezembro de 2014, a quantia de R$ 165 mil serviu para pagar as despesas de Yara Simões de Oliveira Tomaz, irmã do magistrado e atual presidente do TJAM, Yedo Simões.

Porém, o custo de tratamento mais alto foi para o colunista social Alexandre Deneriaz, que faleceu em abril de 2015. As notas fiscais, emitidas em julho daquele ano, totalizam o valor de R$ 785 mil – ou seja, 130 mil reais a mais do que o governo havia gastado em todo o Instituto de Saúde da Criança do Amazonas (ICAM) no respectivo mês.

Em depoimento, o ex-secretário da Saúde, Pedro Elias de Souza, afirmou que recebia ordens da Casa Civil para efetuar os pagamentos. Nesta semana, o MP entrou com uma ação civil pública contra Pedro Elias e outro ex-secretário, Wilson Duarte Alecrim, além do secretário executivo da pasta das duas gestões, José Duarte dos Santos Filhos, por ato de improbidade administrativa.

“Nós [promotoria] estamos pedindo o ressarcimento dos valores pagos, eles têm que voltar aos cofres públicos. Estamos pedindo também que eles [secretários] fiquem inelegíveis”, frisou Cláudia Maria Raposo.

Fachada do TJAM
Fachada do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM) – Foto: Divulgação

Procurado pela equipe de reportagem do Fantástico, o ex-secretário Pedro Elias disse que não iria se manifestar sobre o ocorrido; já Wilson Alecrim foi contatado por meio de seu advogado, mas optou por não se pronunciar; José Duarte, que está passando por um tratamento contra um câncer, não foi localizado; enquanto os dois ex-governadores, Omar Aziz e José Melo, afirmaram desconhecer os fatos e a investigação.

Por telefone, o ex-prefeito de Santa Isabel do Rio Negro, Mariolino Siqueira, que se encontra em prisão domiciliar, confirmou que seu tratamento havia sido pago com o dinheiro do Estado, mas completou dizendo que não sabia que isso era irregular. Já a família do colunista social, Alex Deneriaz, declarou – também por telefone – desconhecer o valor gasto no tratamento dele e quem arcou com as despesas.

Entre os desembargadores que tiveram as despesas médicas pagas, Domingos Chalub relatou que apenas a estadia no hospital havia sido custeada pelo governo. Ele afirmou, ainda, que procurou pessoalmente o secretário de Saúde para ressarcir a quantia, mas não teve resposta.

A desembargadora Graça Figueiredo não respondeu à reportagem do Fantástico para esclarecer a questão. O magistrado Lafayette Carneiro negou que as despesas médicas da mãe e da esposa tenham sido pagas com o dinheiro dos cofres públicos. Já Yedo Simões disse que os custos do tratamento da irmã dele foram feitos pelas vias legais, e que havia um convênio entre o Governo do Estado e hospitais de outras regiões. O MP negou tal informação.

Em nota, a assessoria do Hospital Sírio Libanês afirmou que recebeu pedido e autorização do governo do AM para prestação de assistência hospitalar e que cumpriu com os serviços, além de ter enviado todas as informações referentes a esses atendimentos para o MP.

A Secretaria de Saúde do Estado do Amazonas informou que as acusações dizem respeito à gestão anterior e que está colaborando com as investigações.

Fachada do MPF
Fachada da Procuradoria da República do Amazonas (PRAM) – Foto: Divulgação

Lista de beneficiados

Segue a lista dos principais beneficiados com atendimento no Sírio Libanês, entre 2013 e 2016:

Domingos Jorge Chalub Pereira – R$ 63,4 mil em setembro de 2015; R$ 168.772,70 fevereiro de 2016 e
R$ 127.182,79 (empenhado em fevereiro de 2016).

Sebastião Andrade Machado – R$ 29,8 mil em dezembro de 2014 (pagamento feito no ano seguinte); R$ 12,7 mil em março; R$ 83,8 mil em maio e R$ 235,1 mil em setembro de 2015.

Maria de Fátima Barreira Castelo Branco – R$ 12,4 mil em fevereiro; R$ 10,8 mil em março; R$ 6,6 mil em abril; R$ 27,1 mil em abril; R$ 119,8 mil em maio e R$ 43,9 mil em setembro (todos os gastos são respectivos ao ano de 2015).

Rebeca de Brito Schramn – R$ 30,8 mil março de 2015.

Washington Régis – R$ 191,3 mil em março de 2015.

Alexandre Deneriaz Papaleo – R$ 785,3 mil em julho de 2015.

Maria das Graças da Costa Vieira – R$ 130,3 mil em setembro de 2015.

Epitácio de Alencar e Silva Neto – R$ 46,4 mil em abril de 2014.

Sildomar Abtibol – R$ 250,8 mil em 2013.

Mariolino Siqueira de Oliveira – R$ 283,2 mil em fevereiro e R$ 24,1 mil em abril de 2013.

Tancredo Castro Soares – R$ 182,5 mil em setembro e R$ 18,2 mil em setembro de 2013.

Francivaldo Garcia – R$ 37,9 mil em novembro e R$ 89,6 mil em dezembro de 2013.

Fabianno Pessoa Figueiredo – R$ 38,3 mil em fevereiro; R$ 53,7 mil + R$ 2,7 mil em abril; R$ 31,6 mil + R$ 19 mil em setembro; R$ 110,8 mil em outubro e R$ 18,2 mil em novembro (todos os valores correspondem ao ano de 2013).

 

*Matéria escrita com base na reportagem do programa Fantástico, exibida em 08/04/2018

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