Por Marcelo Frota Em um rompante se fez o homem e este não se pode definir, pois desde o primeiro […]

O Ser no tempo poético em Cerzir — O Livro dos 50, do poeta Antonio Aílton

Por Marcelo Frota

Em um rompante se fez o homem e este não se pode definir, pois desde o primeiro homem a porvir, vieram os demais que, por ventura, ninguém conseguia definir. Como definir um ser se sua totalidade não é só a face que nos mostra? Em Cerzir (Penalux, 2019), obra de Antonio Aílton, o homem se faz e se desfaz como se fosse uma constante evolução, mostra o passado e o presente, mostra a saudade e a solidão. A cada palavra, a cada frase, a cada sentimento, uma pulsação que obtemos em suas mais de cento e cinquenta páginas, nos faz suspirar.

Nosso suspiro exala a sensação de que algo nos espera, mas o que será? Até parece que estamos em um processo de remendarmos ao molde de um querer, mas como assim não somos, o remendo se desfaz e temos que começar a nos cozer novamente, na verdade constantemente. A obra Cerzir nos faz pensar em nosso processo de nos fazer e reconstruir em uma constante busca do ser.

De início nem percebemos entrar nesse processo, mas quando o tempo passa e vemos que estamos constantemente nos refazendo e recriando ao longo da vida. É por um sopro de energia, é por um sopro de luz, por um simples sopro do seu entender. Nesse processo de sensatez, ou talvez pudéssemos dizer, porque não, que é com a ajuda de nossa insensatez, que nos tornamos o que somos e mesmo assim vemos que não podemos parar de assim o ser.

Nesse livro o autor, de uma maneira singular e simples, nos mostra a construção e a reconstrução diária e constante do homem, do ser vivo, através de suas ações e pensamentos, sem claro deixar de expor seus sentimentos. Porque não dizer que somos uma constante epifania de nós mesmos? Por isso podemos concluir que Antonio Aílton recupera a humanidade mais profunda do ser, mostrando que não somos apenas uma esfinge a ser observada e, porque não dizer, admirada.

Adentramos as melodias musicais das palavras que nos trás para a realidade. Antonio Aílton Santos Silva celebra seu cinquentenário de existência com a publicação de Cerzir, onde o mesmo retoma a região maranhense através da poesia brasileira, assim como se fez Gonçalves Dias, Raimundo Corrêa, e porque não dizer, Manoel Bandeira.

Assim como em “A lição” aprendemos nosso caminhar, vemos os tropeços que levamos ao longo do caminho para chegar onde queremos realmente chegar, em suas palavras “Os ventos falam pouco, mas assoviam/a sua solvência de séculos, carregando/o fardo fátuo das estradas”, percebemos que o caminho a que temos que percorrer não é fácil para responder o ser ou não ser, para mostrar o que somos mas talvez não somos e com um simples toque nos reforça essa ação “no corpo traspassado da almação/um dia basta para o ritmo, números e números/não”.

Nossa existência parece estar em um constante ir e vir, e são nessas idas e vindas de nosso ser que nos vemos aparentemente dentro de alguns déjà-vus. Assim como na vida, se faz na obra, nas escritas de “Outdoors da volta” vemos nossa passagem como um sopro “É preciso subverter teu déjà-vu/ a jaqueta de couro e o sapato marrom/ Comparados a tanto espanto no possível/ por vir”. Mas como nada é para sempre, em um segundo podemos nos desfalecer, em vida, em pensamentos, ou qualquer outra coisa por vir.

Por fim podemos dizer que o mundo não é justo, é sujo e que mesmo ao tentarmos nos conectar a ele, não saberemos como pertencer a este, por isso precisamos nos fazer como ser, para conseguir sobreviver assim como nos diz em “Carta à filha”, onde nos mostra que “O mundo é sujo, filha, estende o teu vestido/ e então por dois dias espera teu marido/ se ele não vier, vive tua lenda/ respeita a ti mesma e costura tua renda”. E é assim que nos reconstruímos, costurando-nos a viver uma vida que talvez nem seja a nossa.

Em Cerzir o autor consegue chegar e penetrar em cheio no nosso ser, que se encontra nessa constante busca e refazimento que ao que tudo parece, se sermos ou não o que queremos ou devemos, será que é essa a questão? Faz-nos ter uma reflexão e uma visão diferenciada do que é ser, e se ter a sim mesmo. Que sejamos capazes de nos deixar envolver pelas palavras sinceras e de certa forma singelas, mas que nos trazem a realidade de se auto ser.

Sobre o autor:

Nasceu nos ermos de Bacabal-MA, em família sem letra, em 1968. Formação primeira: a literatura de cordel, que lia em noites de lamparinas para os ouvintes simples que chegavam. Depois das primeiras professoras, outros espaços, outros HQs, outras literaturas. Festivais poéticos da UFMA, recitais, e a vibração total da poesia dos telhados de São Luís do Maranhão. Curso de Letras.

O fundamental grupo Curare de poesia, nas discussões, buscas literárias. Dois prêmios Cidade de São Luís e o Prêmio Cidade do Recife – Eugênio Coimbra Júnior, 2006. Em Recife-PE, também cursou o Doutorado em Teoria da Literatura, de 2013 a 2017. É membro da ALL – Academia Ludovicense de Letras e da AMEI – Associação Maranhense de Escritores Independentes. Além de participação em diversas antologias, é autor dos livros As Habitações do Minotauro (poesia, FUNC-MA, 2001), Humanologia do Eterno Empenho (ensaio, FUNC, 2003), Os dias perambulados e outros tOrtos girassóis (poesia, Fundação de Cultura do Recife, 2008), Compulsão Agridoce (Poesia, Paco Editorial, 2015), Martelo & flor: horizontes da forma e da experiência na poesia brasileira contemporânea (Teseensaio, EDUFMA, 2018).

GÊNERO:  Poesia

FORMATO: 16×23 | ANO: 2019

PÁGINAS: 156 | Pólen Soft 90 gr

Disponível no site da Penaluxhttps://www.editorapenalux.com.br/loja/cerzir

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