Um estudo pioneiro realizado em Maceió (AL) detectou, pela primeira vez na América Latina, partículas de microplástico em placentas e […]

(Foto: Arquivo/Agência Brasil)

Microplásticos já contaminam bebês antes do nascimento, revela estudo em Maceió

Um estudo pioneiro realizado em Maceió (AL) detectou, pela primeira vez na América Latina, partículas de microplástico em placentas e cordões umbilicais de bebês nascidos na capital alagoana. A descoberta, publicada nesta sexta-feira (25) nos Anais da Academia Brasileira de Ciências, coloca o Brasil entre os poucos países do mundo a comprovar a presença dessas partículas no cordão umbilical — sendo este apenas o segundo caso registrado globalmente.

A pesquisa, conduzida por uma equipe da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), analisou amostras de placenta e cordão umbilical de dez gestantes atendidas pelo SUS nos hospitais universitários de Maceió. O resultado chamou atenção: em 8 dos 10 casos, a concentração de microplásticos era maior no cordão umbilical do que na placenta, sinal de que as partículas não apenas ultrapassam a barreira placentária, mas chegam até os bebês antes mesmo do nascimento.

— A placenta é um grande filtro. Então, quando os primeiros estudos mostraram a presença de microplásticos nela, achamos que funcionava como uma barreira. Mas o que vimos foi o contrário — destaca Alexandre Urban Borbely, líder do grupo de pesquisa em Saúde da Mulher e da Gestação da UFAL. — Esse é o retrato do fim da gestação. Durante os nove meses, quanto passou?

Utilizando a técnica de espectroscopia Micro-Raman, que identifica com precisão a composição química de moléculas, os cientistas encontraram 110 partículas nas placentas e 119 nos cordões. As mais frequentes foram polietileno (usado em embalagens descartáveis) e poliamida (componente de tecidos sintéticos).

Contaminação crônica

Borbely estuda o impacto dos microplásticos na gestação desde 2021, em parceria com pesquisadores da Universidade do Havaí. A equipe internacional já havia detectado a presença dessas partículas em placentas de mulheres havaianas, com índices crescentes ao longo dos anos: 60% das amostras estavam contaminadas em 2006, número que saltou para 100% em 2021.

No Brasil, embora todas as amostras analisadas apresentassem contaminação, os pesquisadores notaram menor presença de aditivos químicos associados aos polímeros plásticos em comparação com os dados dos EUA. Um dos objetivos do estudo brasileiro foi justamente investigar essa realidade em populações em situação socioeconômica mais vulnerável, frequentemente ignoradas pela literatura científica internacional.

De onde vêm os microplásticos?

A origem da contaminação ainda é incerta. Microplásticos estão no ar, na água e nos alimentos, o que dificulta apontar um único responsável. No entanto, Borbely destaca duas possíveis fontes predominantes em Maceió: o consumo frequente de frutos do mar — especialmente moluscos filtradores — e o uso de água mineral armazenada em galões plásticos, que liberam partículas ao serem expostos ao sol.

Com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas, do CNPq e da Finep, o estudo será ampliado: agora, pretende-se analisar 100 amostras de gestantes e verificar possíveis relações entre a presença dos microplásticos e complicações gestacionais ou problemas de saúde neonatal. Para isso, está sendo criado o Centro de Excelência em Pesquisa de Microplástico, com previsão de publicação de novos resultados em 2027.

Efeitos ainda desconhecidos

Os cientistas ainda não sabem exatamente o impacto dessa contaminação no organismo em formação, mas já há indícios preocupantes. Um estudo americano recente relacionou um tipo específico de polímero encontrado na placenta a casos de parto prematuro. E pesquisas anteriores do próprio grupo brasileiro demonstraram que microplásticos de poliestireno atravessam com facilidade a barreira placentária, alterando o metabolismo da placenta e provocando estresse oxidativo — o que pode afetar diretamente o desenvolvimento fetal.

— Toda uma geração está nascendo já exposta a esses plásticos desde o útero. O plástico está, de alguma forma, compondo o organismo dessas pessoas — alerta Borbely.

Para ele, o combate à contaminação por microplásticos não pode ser encarado como responsabilidade individual. É uma questão de política pública.

— O Brasil ainda não tem uma regulamentação específica para o plástico. Precisamos de ação do Estado: regular a produção, o descarte, e implantar filtros nas indústrias. Reduzindo o plástico no ambiente, a gente reduz o que entra no nosso corpo — conclui.

(*) Com informações: Agência Brasil

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